Decisões difíceis, mas necessárias
A importância da intervenção e da proximidade física do médico junto ao paciente e familiares no processo de terminalidade da doença foi o foco do simpósio “Decisões difíceis”, realizado na semana passada durante o XIX Congresso Brasileiro de Geriatria e Gerontologia, em Belém (PA). O simpósio reuniu dois grandes especialistas em medicina paliativa – a geriatra Cláudia Burlá, do Rio de Janeiro, membro da Câmara Técnica sobre a Terminalidade da Vida e Cuidados Paliativos do Conselho Federal de Medicina, e o médico americano Frank Ferris, diretor do Instituto de Medicina Paliativa de San Diego (EUA).
Cláudia enfatizou a importância de explicar, com muita clareza, o conceito de medicina paliativa a pacientes e, especialmente, familiares. “Há um aparato disponível para atender situações de terminalidade que vão muito além do cuidado. O paciente que enfrenta esse processo pode e deve ser muito bem assistido – um paciente terminal que sofra dor, por exemplo, é algo que não podemos aceitar de forma alguma”, ressaltou.
A medicina, segundo a especialista, dispõe de medicações capazes de aliviar esse sofrimento físico. “O alvo dos cuidados paliativos é a pessoa doente, com ênfase no alívio de seu sofrimento e também no atendimento das suas demandas psicossociais,” disse.
O processo de terminalidade, disse a especialista, exige preparo de médicos e equipes envolvidas. E garantiu que os procedimentos associados à medicina paliativa no Brasil estão assegurados por lei no Conselho Federal de Medicina.
“Não se trata de prática de suicídio assistido nem eutanásia”, destacou. “Estamos oferecendo bem-estar e uma resposta aos problemas de uma doença incurável.” O mesmo conceito de atuação foi defendido pelo médico Frank Ferris. “O paciente tem de estar confortável. E precisamos estar próximos dele nesse momento, assim como da família. Os médicos não podem ainda esquecer de preparar suas equipes para esses momentos, que muitas vezes podem se prolongar por meses”, observou. Caso contrário, na visão desses especialistas, o sofrimento do paciente tende a ser estendido.
Ferris tocou em pontos importantes: a nutrição e a hidratação do paciente terminal e a ventilação mecânica. Segundo ele, diversos estudos comprovam que a administração desses procedimentos, no fim da vida, provocam mais danos do que benefícios aos pacientes. Dependendo da situação eles podem, inclusive, aumentar o mal-estar nos doentes terminais e acelerar o óbito.
Ferris mostrou alguns exemplos dos problemas causados pela continuidade da administração de líquidos e suprimentos nutricionais, como a retenção de líquidos no organismo que provocam inchaço e um imenso mal-estar no paciente, além do risco aumentado de infecções.
No caso da ventilação, ela também é causa de desconforto que poderia ser evitado. Ferris questionou principalmente o sentido de se manter a ventilação, a nutrição e a hidratação num paciente cujo quadro todos sabem ser irreversível. “O que irá matar esse doente não é a ausência desses procedimentos, mas sim a própria doença. Todos têm de ter isso claro: do paciente aos familiares e, principalmente, os médicos”, enfatizou.
O especialista insistiu na importância de o médico se colocar no lugar do doente e alertou sobre a necessidade da equipe médica ter claro como o paciente, diante de um diagnóstico sem perspectivas terapêuticas, deseja ser tratado no final da vida.
“Quanto antes conversamos a respeito disso com o doente e seus familiares, melhor para todos”, finalizou. Uma conversa difícil, certamente, mas que, com maior preparo por parte de todos, tende ser a escolha mais acertada e a que menor dor irá provocar em todos os envolvidos.