Olhar de Cuidados Paliativos em salas de emergência
Em março ocorreu o 2o Fórum da ABRAMEDE, onde foram discutidos assuntos relativos às residências de Medicina de Emergência, com a presença de coordenadores de residência de vários centros no Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul. Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP) esteve presente representada pela médica Sabrina Ribeiro, coordenadora do Comitê de Emergência da ANCP.
Desde a primeira prova de título em Emergência, realizada em 2018, habilidades em Cuidado Paliativo foram consideradas essenciais para a formação do emergencista. Um currículo mínimo contemplando os principais temas foi elaborado em esforço conjunto entre ANCP e Associação Brasileira de Medicina de Emergência (ABRAMEDE) e está em constante aprimoramento.
“O olhar de cuidado paliativo sobre o paciente com doença avançada, tão freqüente em nossas salas de emergência é essencial para um bom atendimento. Habilidades como comunicação de más notícias, expertise em controle de sintomas, identificação de pacientes em terminalidade, trabalho em equipe multiprofissional e indicação correta de procedimentos e medidas invasivas são fundamentais no nosso dia a dia” explicou Sabrina Ribeiro.
Segundo a especialista, o ambiente corrido das salas de emergência, a sobrecarga de trabalho, a falta de uma relação médico-paciente estabelecida são fatores que dificultam a implementação de ações de cuidado paliativo na emergência. Porém, é na emergência que muitos pacientes com doença grave e incurável têm seu único acesso a serviço de saúde.
“Uma pesquisa realizada em nossa Unidade Crítica de Emergência e publicada na revista Palliative and Supportive Care evidenciou que 34% dos pacientes que recebemos na UCI são portadores de doença avançada e incurável, com expectativa de óbito nos próximos 6 meses. No entanto, menos de 1/5 deste subgrupo tem acesso a cuidados paliativos durante a internação” destacou a paliativista.
Sabrina aponta que o reconhecimento precoce do paciente candidato a cuidado paliativo pode evitar intervenções que tragam sofrimento adicional ao paciente e não sejam benéficas em relação a aumento de sobrevida e de qualidade de vida. E comentou que ao atender o paciente na sala de emergência, quatro perguntas são essenciais, são elas:
1- Você se surpreenderia se este paciente morresse em um ano (ou nessa internação)? “Esta pergunta, chamada internacionalmente de pergunta-surpresa, tem correlação estabelecida com mortalidade em 1 ano e foi validada inclusive na emergência e depende apenas de avaliação subjetiva pelo profissional de saúde”, explicou.
2- O quadro agudo é reversível? “O emergencista precisa compreender o quadro agudo e identificar a causa, distinguindo entre progressão da doença de base e intercorrências potencialmente tratáveis. Pacientes com doenças incuráveis mas com intercorrências agudas reversíveis podem inclusive ser candidatos a medidas invasivas. Já a instituição de suporte vital em situações em progressão de doença incurável pode implicar em distanásia”, pontuou.
3- Onde o paciente está em sua trajetória de doença? “Sinais como perda de peso, queda de funcionalidade e internações repetidas podem indicar que o paciente se encontra em fase avançada de doença e pode não se beneficiar de intervenções mais agressivas”, enfatizou.
4- Quais os valores do paciente? “É importante lembrar que cuidado paliativo é “fazer tudo” sempre pelo paciente, mas “tudo“ pode ter um significado diferente para diferentes pacientes. Para alguns, fazer tudo pode ser priorizar o controle de dor e de sintomas, enquanto outros podem ter como prioridade intervenções que possam estender o tempo de vida, mesmo que isso implique em procedimentos invasivos”, destacou.
A médica chama atenção para o fato que o dia a dia da emergência é feito de decisões difíceis, muitas vezes tomadas em minutos. “O cuidado paliativo nos lembra de que a melhor decisão é sempre a que respeita os desejos e valores de nossos pacientes”, ressaltou a paliativista.
Sabrina Corrêa da Costa Ribeiro é médica supervisora da Disciplina de Emergências do HCFMUSP e preceptora da residência de Medicina de Emergência do HCFMUSP. Tem titulo de especialista em Emergência (ABRAMEDE/AMB) e certificação de área de atuação em Cuidado paliativo (ANCP/AMB). Atualmente é membro do Comitê de Titulo de Especialista em Emergência da ABRAMEDE e coordenadora do Comitê de Emergência da ANCP.